Estranho como admirava a beleza daquela garota, nos corredores da escola ela se tornava totalmente visível, não usava roupas extravagantes, era apenas um borrão em meio ao pessoal. Mas para mim, ela era a mais perfeita dentre tantas. Éramos ambos do 2º ano, mas de classes diferentes, eu apenas a via durante o recreio e algumas vezes antes de começar a aula. Jamais há encontrei fora da escola.
Sentada no
chão do corredor com o ipod em punhos se desligava do mundo ao seu redor. Na
manhã em que conversamos pela primeira vez, ela estava usando coturno, calça
jeans, além de uma camiseta dos RAMONES.
Por tantas
vezes cruzei por ela no corredor, e em tantas outras ficava imaginando a música
que estava escutando.
Parece idiota, mas sonhava ser como ela, ter
coragem de gritar ao mundo foda-se. Nosso
primeiro contato foi dentro da biblioteca. Eu estava sentado lendo e ela
simplesmente ao passar virou o livro de modo que pudesse ver a capa.
-Menina que
roubava livros, é uma boa história. - comentou ao me fitar com o olhar.
-Sim,
retrata bem a Alemanha nazista. – Não sabia como me portar diante do seu rosto
maquiado.
- Hitler
foi um grande líder, mas infelizmente suas idéias eram tolas. Formar um mundo
de arianos não adiantaria, o problema desse mundo são os alienados.
Sua voz era
doce, seus coturnos estalavam no piso a caminho das estantes.
Por muito
tempo não saiu da minha cabeça aquele final de frase, “o problema do mundo são
os alienados.”. Vindo dela foi como um
ateu pedindo para eu ir à igreja, na minha percepção ela era a pessoa mais
alienada que eu já vira, perdendo apenas para mim próprio. Ela ficava sempre
ali com seu fone, ou lendo. Era um ser completamente anti-social, como podia
chamar alguém de alienado. Resolvi que deveria achar maneiras de me aproximar.
Depois de
dias cheguei à conclusão que ela tinha segredos, que não era apenas aquele ser
melancólico jogado no corredor, eu queria descobrir mais sobre ela.
O ano já
estava no fim, e todas as informações que eu tinha eram que curtia Ramones,
Pitty, Evanescence, e mais algumas bandas. As férias chegariam e eu não a veria
mais. E assim foi.
Nas férias
cada dia era uma eternidade. A maior parte do tempo fiquei em casa escutando as
músicas que imaginava que ela gostava e pensando como faria para desvendar seus
mistérios. Não tinha o que eu fazer, apenas sentar e esperar os dias passar.
Em um dia
nublado próximo ao fim das férias, sentado na sacada da minha casa, lendo o
livro que havia ganhado de natal, podia ver o mundo que todos julgavam ser um
mundo perfeito. Aquela velha senhora passeado com seu cachorro.
- Ah se ela
soubesse o que o marido faz enquanto diz que está no trabalho.– Sussurrei
baixinho.
E aqueles garotos aos berros enquanto jogam
videogame na casa da frente.
-Um dia
saberão que jogar videogame não é a melhor coisa deste mundo.– Me vi aos risos
ali sentado.
Perdi-me em
devaneios olhando a movimentação da rua e adormeci. Quando acordei já estava
escuro, o sereno já havia molhado minha pele e minha mãe esmurrava a porta do
meu quarto.
- Carlos,
ta ai?- pude notar a seriedade em sua voz- Desce agora pra jantar.
- Já vou
mãe!- gritei ainda acordando.
Quando
levantei me deparei com um pequeno avião de papel jogado em meus pés. Era um
avião perfeitamente dobrado, tinha algo escrito.
Desdobrando
rapidamente li as palavras que estavam escritas em uma caligrafia quase
perfeita.
“Oi garoto
leitor, livro novo? Espero que tenha acabado o último.”
Logo pensei
na misteriosa, só poderia ter sido ela que havia me enviado tal recado. Desci
as escadas correndo, sentei-me à mesa e fui logo devorando o que via em minha
frente.
- Vai se
engasgar- Pude ouvir meu pai.
Não dei
atenção, terminei de comer e subi as escadas correndo. Cheguei ao quarto e
novamente peguei pra ler o bilhete que em um momento foi um avião.
Em minha
cabeça projetava o rosto da garota que por dias não havia visto.
-Ela passou
aqui, me viu dormindo com o livro em mãos. Será que ela notou que estava
dormindo. Com certeza sim. Burro burro burro- Sussurei ao acariciar aquele
papel que acreditava ser da minha amada misteriosa.
Nos dias
seguintes fiquei observando da sacada do meu quarto. E não vi nada além do pacato cotidiano, vizinhos que cumprimentavam,
crianças que corriam pelos jardins. Os
dias passaram e as férias foram acabando.
No último
dia das férias minha mãe subiu as escadas enquanto estava deitado em minha cama
ouvindo música.
- Carlos,
abre a porta. Chegou uma carta para você. – Levantei calmamente, pois imaginava
ser apenas propaganda ou algo assim. – O mais estranho é que não tem remetente
e nem selo. Tá apenas escrito em caneta – minha mãe fez um silêncio- para
Carlos, vírgula, o leitor da rua.
Abri a
porta rapidamente, peguei a carta e fui logo rasgando para abrir.
“Sei que
deve estar curioso, eu também estaria. Amanhã na escola talvez eu me revele
para você. Talvez não. Sou tímida. Queria ser um livro para sempre estar entre
seus dedos.”
Tremia ao
ler tal carta. Não consegui dormir naquela noite. Estava ansioso demais para
descansar. Reorganizei meus materiais muitas vezes. Já se passava das duas da
madrugada quando deitei. Não preguei o olho um segundo.
Eu odiava o
primeiro dia de aula, aqueles jogos de integração e as fofocas sobre as viagens
e festas... A escola quer formar adultos e acaba por fazer um regresso ao
jardim de infância no primeiro dia letivo. Uma tremenda tolice em minha
opinião.
Aquele dia
não foi diferente, mas algo novo despertou a minha atenção.
Sentada em
um canto da sala estava a tal garota. Com uma camiseta desbotada do Nirvana,
uma calça Jens, e um All star preto. Permaneceu calada todo o 1º período.
Eu do outro lado da sala tentava me manter
calado, observei que ela me olhou algumas vezes. Mas eu não conseguia parar de
olhar.
No inicio do segundo período o velho professor
de História fazia a chamada quando ouvi a única palavra que ela pronunciou até
aquele momento. O professor ergueu os olhos sobre a turma quando disse em um ar
desanimado:
-
Franciele?
Erguendo a
cabeça ela apenas disse:
-Aqui!
-Continuou a fazer o que estava fazendo, vendo de longe eu acreditava ser um
desenho.
Os períodos
passaram um após o outro. E não ouvi mais nenhuma palavra de seus belos lábios.
Durante o
recreio a sala permaneceu aberta. A Franciele continuou ali sentada rabiscando
algo em seu caderno.
Resolvi
tomar uma atitude, vou caminhar até lá e vou ver a letra dela. Levantei e fui a
passos tétricos até a mesa dela. Parei diante de sua classe fitando o caderno
com os olhos.
- E ai?-
Pude ouvir. Ela não ergueu os olhos para me perguntar.
Pensei: é a
timidez.
- Me chamo
Carlos. -falei entre os dentes.
- Eu
Franciele, gostou do desenho?
-Sim
gostei- respondi- Você costuma passar na minha casa?
-Nem sei onde você mora!- falou rindo- Acho
que está se confundindo.
- Não foi você que me mandou a carta? O
aviãozinho?
- Desculpe rapaz, não sei nem seu nome.
Neste momento o barulho de uma classe sendo
arrastada calou ambos. Pude ver Juliana, levantando rapidamente e correndo porta afora aos
prantos.
- Ou caiu
um cisco no olho daquela menina, ou você descobriu quem é que te mandou os
bilhetes. - Franciele respirou fundo – Nem te conheço, você para mim é apenas
mais um nessa sociedade medíocre. Notei que passou a manhã me olhando, me
desculpe, você não faz meu tipo. Cresça e apareça. Agora saia daqui, você me
causa náuseas. Garoto idiota!
- Desculpe-
foi só o que falei. Suas palavras ecoavam em minha cabeça.
Depois
daquele dia mudei meus conceitos sobre a menina rebelde que descobri se chamar
Franciele.
Juliana não
voltou para sala de aula naquela manhã, naquela tarde recebi uma nova carta.
“Fui tola
em não me identificar, não falar o que sinto, mas o que sinto não é de hoje.
Muitas vezes te vi lendo na biblioteca, e passei reto sem nem ao menos dizer
uma palavra. Foram muitas as vezes que você estava na sacada e eu apenas olhei,
sem nem ao menos dizer uma palavra.
Espero que
seja feliz com a Franciele.
Abro mão da
minha felicidade pela sua.”
Na manhã
seguinte descobri através de colegas que Juliana tinha mudado de escola.
Estaria estudando em outro bairro só para não ver mais meu rosto.
Nunca mais
senti nada pela Franciele, o único sentimento que habitava meu coração era o de
pena. Pena da Juliana, que abriu mão de seus amigos, deixou sua escola por
causa de um amor não correspondido. E
hoje acabo por sentir pena da Franciele, que com toda sua inteligência, e
essência de superioridade fica isolada do resto da turma.
Muito bom! Eu amo seus textos e está realmente envolvente!
ResponderExcluirNossa! Acho que não me lembro de ter lido algo tão bom...tão... Tão maravilhoso ao ponto de ser indescritível! É a primeira vez que leio um texto seu, e confesso que me apaixonei! Muito obrigada!
ResponderExcluirBeijos. Espero encontrar textos tão bons assim sempre!
Nossa, sem palavras para o seu texto. Tão bom, tão lindo, tão envolvente, tão maravilhoso, tão bem escrito! Me apaixonei pelo seu texto! Sempre virei aqui!
ResponderExcluirhttp://lollyoliver.wordpress.com/
Parabéns pelo texto, muito bem escrito, e é sempre bom investir no público alvo para trazer sempre mais resultados para o blog. Abraço!
ResponderExcluirhttp://blogpapodeblogueiro.blogspot.com/
Muito legal ;d
ResponderExcluirTrés Jolie mon chéri. *-*
ResponderExcluirFiquei encantada com tua escrita.
(:
Amei o texto
ResponderExcluirvc escreve muito bem
parabens!
comenta no meu tbem.
Nossa! Ótimo texto, ótimo blog, ótimo autor! Parabéns gostei bastante do desenrolar da história, de como vc tratou cada assunto e foi detalhista. Parabéns. Seguindo;
ResponderExcluirDiogopensamentos.blogspot.com
Texto belo. Simplesmente genial.
ResponderExcluirhttp://dinheirodemetal.blogspot.com
Fiquei fascinado com o texto, deveria investir e fazer disso um livro. Estou escrevendo um, e acredite, é uma delícia... rs
ResponderExcluirParabéns pelo texto! Fiquei boba com ele. Ficou realmente bom. Sucesso no blog :D
ResponderExcluirAdorei mt o post ! Está de parabéns !
ResponderExcluirbeijos : @maysa_lobo
http://www.pensamentosdasgirls.blogspot.com/
Acho tão incrível homens que escrevem dessa forma, realmente muito bom, parabéns!
ResponderExcluirAmei o texto, parabéns! :)
ResponderExcluirAdicionei aos favoritos... rsrs
Abraços!!!
Lindo texto! As vezes criamos a imagem de uma pessoa, e quando a conhecemos de verdade vemos o quão diferente ela é. Tudo bem detalhado e escrito. Abraços.
ResponderExcluirNossa mto bacana essa história começou mto bonito mas não terminou tão bem mas fazer oq a vida tem dessas coisas as vezes
ResponderExcluirah estamos entregando livros para os 4 mais criativos se puder participar ficaremos felizes
Gostei do seu blog, você escreve mto bem!
ResponderExcluirVocê escreve bem. ^^
ResponderExcluiré tão ruim amar em silêncio =X
ResponderExcluirParabéns pelo texto!
Gostei deste texto que termina em uma decepção amorosa. Os desencontros costumam dar histórias melhores, não é?
ResponderExcluirhttp://123acao.wordpress.com/
Que história forte!
ResponderExcluirDeixar amigos e etc por algo assim, de fato é uma pena!
Amei o texto
ResponderExcluirsucesso
comenta no meu blog tbem.
seus textos são perfeitos !
ResponderExcluirJá te disse que adorei esse conto e que ele é muito bem escrito e perfeito né?
ResponderExcluir(Escrever bem deve ser coisa típica de gaúcho, haha, brincadeira)
Mas que tu escreve bem, escreve! Abraço!
http://lollyoliver.wordpress.com/
Amei o conto
ResponderExcluirvc escreve perfeitamente.
abraços.