quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Depedência

 

Era madrugada.
 O canto mais escuro da pequena praça, vários jovens estavam sentados no chão. Mas uma garota me chamou atenção.
-Licença, eu posso falar com a Susana?- Agarrei Susana pelo braço, mas a amiga quis protestar- Te liga garota o assunto é entre eu e a Susana.
Logo formou um pequeno grupo entre nós, os jovens em maioria alcoolizados já partiram para cima de mim. Serrei os punhos prontos para a briga, nesse momento Susana ergue os olhos e diz:
-Calma galera, vou ali dispensar o coroa. Já volto.  

Caminhamos poucos metros para onde teríamos certeza que não seriamos escutados.
-Você tem id...- tentei questionar.
Susana me interrompeu.
- É simples para você, um coroa cheio da grana que passa o dia trancado em um consultório, depois sai de lá, transa com sua esposa e dorme tranquilamente. É fácil falar um monte de coisas, manipular meus sentimentos, induzir a boas ações. É simples.
-Susana, eu avisei que a reabilitação não seria fácil. Que algumas pessoas iriam te virar as costas.
- Sim, algumas pessoas? O mundo me virou as costas. Meus pais desconfiam de mim, não consigo reaver minhas antigas amizades, pareço um andróide quando estou com eles. Sou o foco das atenções. Sei que o senhor me ajudou, mas faz favor? Deixa-me viver minha vida! Tu, não é mais meu médico. – As palavras se repetiam em minha mente, eu não queria estar ouvindo aquilo.
Meu coração pulsava forte no peito, ao longe via que aqueles jovens que pareciam ter sede pelo meu sangue, por fim desengasguei:
- Minha relação com você foi maior do que Doutor e Paciente, mesmo quando você não freqüentava mais a clinica, ainda me procurava. Estou ciente do que está passando, já ouvi dezenas de histórias como a sua, e acredite, faz anos que não tenho uma noite de sono tranqüilo. Sua mãe está preocupada.
- Minha mãe, no fundo eu tenho pena dela. Não merece a filha que tem. Susana começou a chorar- Você está aqui porque ela mandou? Aposto que sim, deve estar transando com ela. – Com o punho tapeou meu ombro algumas vezes.
- Sua mãe nem sabe que estou aqui, liguei para a sua casa e ela atendeu, perguntei por ti, disse que queria conversar. Sua mãe disse que você tinha saído com uma amiga, tinham ido ao shopping, se bem te conheço não freqüenta shopping.  Resolvi passar por aqui, ver quem estava, por sorte eu te vi.
Susana se sentou no meio fio, desabou a chorar.
-Não é o que tu pensa cara, não voltei para as drogas.  Aquela ali, a de cabelo mais curto, a morena. Ela é minha melhor amiga.
- Aquela que te puxou quando cheguei?- Questionei sem entender nada.
- Sim ela mesma, ela é usuária de cocaína. – Susana retomou o fôlego. – Ela tentou, mas não conseguiu parar. Hoje viemos aqui porque eu estou quitando a dívida dela. E quero ajudá-la assim como você me ajudou. – Susana estava realmente abalada.
-Menina, porque me fez acreditar que você está de volta nas drogas. Porque não apareceu mais para conversar no consultório. – Meus pensamentos estavam a mil. Não entendia mais nada.
- Você é um ótimo psiquiatra, mas nossa relação foi além. Larguei as drogas e hoje pareço depender de ti. Tu tens esposa, não posso mais te ver.
-O que está sentindo por mim é provocado pela carência afetiva, à falta que suas amizades fazem, fique à-vontade em voltar quando quiser ao consultório, ou me ligar. E fico feliz por tentar ajudar sua amiga, mas incentive-a a procurar ajuda médica, apoio moral pode não ser o bastante.
Marcos, - poucas vezes havia me chamado pelo nome. Medindo as palavras falou- Estou fazendo o possível para ajudá-la.  Obrigado por tudo.
- Susana, você sabe que uma pessoa para reabilitar precisa de muito apoio. Apóie-a, e sem esquecer, que quanto mais tiver apoio, melhor será. Seus amigos podem desconfiar, reconquiste a confiança deles. Mostre que é a garota simpática, e extrovertida que não precisa de drogas para se divertir. Quero que tenha dezenas de amigos, não quero que se prenda apenas a mim, mas espero que jamais suma. Não brinque sobre a borda do poço, pois se cair... Posso não querer te ajudar.
Nisso a Kety veio para junto de nós. Sentou ao lado da Susana e falou:
- Susana, nós podemos ir.
  Um sorriso estampava seu rosto, mas no fundo dos olhos pude enxergar um medo. Medo de não ter certeza do amanhã.
- Kety, esse é o Marcos que te falei. – Susana falou apontando em minha direção.
- Marcos, o doutor? – Os olhos da garota mostravam um imenso espanto. – Prazer, Quetlen ou pode chamar de Kety.
- Prazer, o próprio. - Cumprimentado com um aceno de cabeça. – Estão apé? Deixa que levo vocês.
Dirigi calado até a casa da Susana, as deixando no portão.

sábado, 25 de dezembro de 2010

Tudo erro Meu


     
      Era uma Sexta feira, como tantas outras sextas. Minha noiva teve que ficar até mais tarde no trabalho. Minha noiva se chamava Lílian, era linda, não media esforços para me fazer feliz. Porém por muitas vezes estava ausente nos momentos que eu a queria ao meu lado. Nem sei por quantas sextas-feiras, eu fiquei sozinho em casa enquanto ela trabalhava. Meus amigos por muitas vezes me convidaram para ir a festas (programinhas em casais) e eu não pude ir porque minha noiva estava trabalhando. A Lílian tinha uma amiga de infância na qual confiava até nossos segredos mais íntimos, ela era a Bianca, uma garota mal compreendida que sempre se dizia apaixonada por mim. Ela e a Lílian cresceram juntas, tem poucos meses de diferença, quanto à idade. Com 18 anos as duas vieram para Porto Alegre, em busca de melhores condições de vida, dividem um apartamento a poucas quadras do trabalho da Lílian.        
    Eu por ventura do acaso vim conhecer Lílian na lanchonete onde as duas trabalham. Apesar de trabalhar na mesma lanchonete tem turnos diferentes. A Bianca trabalha das 8h até às 16h e a Lílian trabalha das 16h até a meia noite. Bianca nunca, escondeu de mim o que sentia, mas nunca demonstrou nada diante a Lílian.
   Mas eu por medo de estragar a amizade antiga das duas, e com medo de que a Lílian não acreditasse em mim, sempre segredei o que Bianca me dizia, a ela, mas naquela sexta-feira eu cometi um dos maiores erros de minha vida, se não, o maior.
        Era por volta das 21h30min quando a Bianca me ligou dizendo que a Lílian estava com ela, e pediu para que eu fosse até seu apartamento para encontrá-las. Desconfiei, pois a Lílian iria ficar na lanchonete até a meia-noite, mas, as duas moravam juntas a poucas quadras da lanchonete onde a Lílian trabalhava, e por muitas vezes marcamos de nos encontrar ali para sair, mas o estranho era o porquê a Lílian não havia ligado, eufórico me vesti e fui caminhando, doido para ver minha amada acabei esquecendo o celular em cima da cama.
       Quando chego ao apê, vi do que se tratava, era o que eu mais temia, uma armação para que ela ficasse sozinha comigo.  Ela estava sozinha só de shorts e top, nunca havia reparado como ela tinha um corpo tão lindo, quando ela abriu a porta, já veio de chamego, eu tentando me manter sério, perguntei logo pela a Lílian. A Bianca, aquela vadia, em vez de responder começou a beijar o pescoço. Eu me deixei levar pela excitação, comecei a tirar sua roupa, foram poucos minutos e alguns goles, até que estivéssemos transando, ali na sala mesmo. Durante e depois da transa nós bebemos quase uma garrafa de wisque que ela já tinha me oferecido na chegada...  Transamos eufóricos durante um longo tempo, até que entrelaçados como um só, entre beijos, gozamos juntos em um simples sofá de dois lugares...
        Eu caminhava sozinho, pela rua deserta, já era madrugada, notava estar sendo seguido, foi quando ouvi uma voz doce dizer:
              -Não tenha medo quero seu bem! Colocando vagarosamente a mão no bolso, sacou um trident perguntando se eu queria um, eu apavorado por tais movimentos aceitei soltando um sorriso tímido!Perguntei quem era a dona daquele lindo rosto. Ela disse que seu nome não importava, mas todos a conheciam como Angel, e me conhecia de seus sonhos mais lindos, eu sem palavras apenas a beijei! Sua boca era carnuda e seu beijo era leve e frio como o orvalho de manhã de inverno.
Após o beijo ela seguiu caminhando, foi quando gritei:- Pssiuu Angel desejo que não suma, e obrigada pelo chiclete.
         Ela sorrindo expôs um sentimento de estrema alegria e gritou:
- Você trocou o chiclete por sua vida.
        Neste momento cai de joelho junto ao meio fio. Meus músculos se contorciam, meu coração estava batendo com uma velocidade extraordinária. Minha língua parecia que tentava descer pela garganta, meus olhos reviravam. Naquele momento vi a jovem garota debruçada sobre meu corpo, com um olhar de satisfeita. Quando seus lábios sussurram:
-Desculpas, mas sou um anjo da morte designado para buscar jovens que perderam seu lugar no céu.
Com aquele beijo você assinou seu passaporte para o inferno, além de trair sua fiel noiva junto a sua melhor amiga, ainda aceitou um beijo meu; Seus pais nunca te ensinaram a não confiar em estranhos, não foi o chiclete que te matou e sim o beijo que sua boca não negou.
          Eu estava ali implorando por ajuda dentre meus últimos suspiros. Foi quando tudo se tornou um nada, meu corpo estava imóvel, minha respiração que estava ofegante não existia mais...
          Naquele momento acordei eufórico, com a respiração ofegante e a visão turva, notei que ainda estava no apartamento, e que tudo aquilo não passara de um pesadelo, mas a Bianca não estava ali junto a mim.
   Quando ergo meu corpo, para tentar ver as horas, vejo a Lílian vindo em minha direção, muito estressada ela já veio gritando:
               - Seu desgraçado, a Bianca coitada, está chorando ali na cozinha. Que papo é esse de buscar CDs para mim, não e o pior, embebedar a menina para poder se aproveitar de sua ingenuidade... Não, tudo o que existiu entre nós esta acabado... Liguei varias vezes para seu celular, e nada... Fui a sua casa e sua mãe disse que você tinha saído a tempo, dizendo que iria vir aqui me encontrar. Pelo menos podia dar uma desculpa melhor para a pobrezinha de sua mãe, coitada, não merece o filho canalha que tem... Se vista e suma de minha vida, vou tentar acalmar a pobre menina... E nem tente se explicar!
        Coloquei minhas roupas, e sai. A Lílian nunca mais falou comigo. Bianca satisfeita pelo seu feito, continuou a tentar me conquistar, aproveitando que a Lílian não estava mais em seu caminho.
         Hoje já passa de um ano que terminamos o noivado, apesar de ter ficado com varias outras garotas, por muitas vezes pedi e ainda peço a Deus para que o sonho que tive aquela noite chuvosa fosse realidade, pois sem a Lílian o melhor destino é a morte. Jamais guardarei um segredo de uma futura namorada, ou me deixarei levar pelo desejo ou carência, levo a fidelidade acima de tudo.

Feliz Natal


Sou um cara entre tantos outros que não curte o natal. Acho interessante o seu significado, gosto de ver crianças felizes por ganhar presentes, por menores que sejam.
Eu sou um cara que desde guri não gostou de ganhar presente, na verdade não gosto de presentear e nem ser presenteado. Sempre me disse minha avó, Natal não é apenas presente. Natal é tempo de agradecimentos.
Tenho a agradecer neste ano, a todas as pessoas que me apoiaram para que eu mantivesse este blog, pessoas que participaram de meus contos, no processo de criação, ou como personagens.
Este ano conheci muitas pessoas, a grande maioria pessoas ditas de “internet”. Muitas já sumiram da minha lista de contatos, mas outras moram no meu coração.
Tenho a agradecer a Vermelha, por tudo que me ensinou mesmo que involuntariamente. A Bianca, que quantas vezes me ajudou com seus conselhos.
Tenho que agradecer também a Susana (Blog da Susana http://susyramone.blogspot.com/ ), que mesmo após publicar seu tão sonhado livro, continuou me apoiando a escrever.
Sei que não sou a melhor pessoa do mundo, e nem quero. Você me acha fraco como escritor, legal... Digo-te. Não sou escritor. Sou apenas um jovem que escreve o que vem a cabeça.
Tamara, Sarah, Kelly, Carol e Carol ”são duas”, são tantas pessoas.

Tenho que também agradecer a todas aquelas pessoas que mesmo quando eu não estava com internet, me deixavam recados de incentivo a continuar escrevendo... Entre elas está a Lah Martins. Guria, obrigado. Sem você esse pequeno esboço de pensamentos jamais existiria.
E muitas vezes me sinto solitário, sou realmente um egoísta.
Feliz Natal a todos
E obrigado, por quase me obrigarem a criar esse blog.
Espero que em 2011 consiga publicar novos contos, novas Idéias.
Mas a Vocês só tenho a agradecer.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Tequila, Viva el México


Já era passada das 11 horas da manhã, Camila continuava sentada na cama olhando aquele estranho corpo que repousava ao seu lado. Suas lembranças da noite passada eram poucas, apenas devaneios, nada totalmente concreto. Levantou lentamente da cama tentando cobrir sua lingerie com as mãos, estava morta de vergonha.
Procurando roupas pelo chão, pensou:
Que tolice tentar me cobrir. Se ele dormiu comigo, ele viu minha lingerie, pode não lembrar, mas viu. Tenho que descobrir ao menos quem é ele.
Após catar o seu vestido jogado aos pés da cama, Camila vai até a cozinha onde pega um cigarro em um maço aberto encima da mesa. Sentada no sofá com o cigarro apagado entre os dedos revira a memória em busca de lembranças. Quando volta, repousa mais uma vez o cigarro sobre a mesa, ainda sem acender.
- Débora, ela me trará respostas. Bebe pouco, e conhece todo mundo. Ela me ajudará! – Fala a jovem para si mesma.
De volta ao seu quarto, vê o jovem apagado. Mas foca sua atenção na bolsa que procura, nela achará o celular tendo as respostas que deseja. Encontrou sua bolsa sobre a cômoda, aberta, revirada, mas aparentemente com tudo dentro.
Celular em punhos voltou para a cozinha. Débora, Débora cadê você garota. Seu pensamento aflorava diante suas dúvidas. Enfim fez a dita ligação, cada intervalo entre as chamadas era um século para sua percepção, até que atenderam:
-Débora é você?- Sua voz era estridente tamanha a euforia.
- Sim Sim, Pode falar guria. Tô aqui. – Uma voz sonolenta respondeu do outro lado da linha.
- Meeeeu, tu nem acredita, tem um cara deitado na minha cama, não sei nem quem ele é! Muito menos o que rolou na noite passada. O que me diz?
- Tu tava bebaça, disso eu lembro. Quanto a esse cara, diz como ele é? Você estava com tantos. -Pelo tom em sua voz Débora estava debochando. 
Camila nem deu atenção ao deboche, apenas respondeu o que interessava a amiga:
-Moreno, alto, magro, seus vinte anos. No momento está seminu, e apagado.
- Alguém transou noite passada ”risos”. Ontem você estava com um cara que não conheço, acho que era da banda, deve ser esse. Olha a carteira dele, tem documentos. Qualquer coisa me liga, lembro pouco de ontem também. – Desligou antes que Camila pudesse dizer algo.
Documento! Como não pensei nisso, refletia a caminho do quarto. No quarto revirou a calça em busca de documentos. Dinheiro, um molho de chaves, e finalmente carteira de habilitação.
-Menino é até habilitado, vamos ver quem é você. – Novamente falando com si mesma. – Felipe, Felipe, realmente não ligo o nome a pessoa.
Caminhando em direção a sala recolhe o cigarro sobre a mesa. Cata um isqueiro entre a bagunça do balcão, e continua a caminho da sala.
Sentada no sofá, com o documento na mão esquerda, e o cigarro na direita, refletia enquanto fumava. Conquistei minha independência. Faço faculdade, tenho um bom emprego, apartamento aonde ninguém vem me incomodar. Agora não posso engravidar de um desconhecido, beber é divertido, mas de que adiantou, nem sei quem é ele.  Pílula, porque eu não tomo? É simples, mas sempre disse que sexo só no namoro. Muito idiota eu sou. Independência, por isso que estou aqui. Solidão por isso que bebi.  Vou saber a verdade da fonte Ele me contará o que aconteceu. Se é que lembra.
Atordoada com a idéia de uma transa casual Camila caminha rapidamente para o quarto. Mas primeiramente recolocou a carteira de motorista no seu devido lugar.
-Felipe, acorda rapaz! Já é meio-dia, seus pais ficaram preocupados. – Sacudia o corpo do rapaz que nem se quer movia um músculo.
Chamar e sacudir não adiantaram, foi para o plano B. Colocou um CD no radio sobre a cômoda, foi aumentando o volume até chegar ao máximo. Em questão de segundos o jovem estava sentado na cama gritando:
-Abaixa, abaixa. – Ele estava extremamente  assustado com o despertador que Camila usara.
-Se vista e vamos à sala. Quero falar com você. – A voz de Camila era rígida como a de quem da uma ordem.
Camila seguiu para a sala onde esperou o jovem, que minuto depois apareceu totalmente vestido diante seus olhos.
-Apenas quero saber o que rolou noite passada. É só o que quero de você! – Camila foi severa, não queria dar mole para o rapaz.
O rapaz passou a mão na cabeça, coçou o queixo e questionou:
-Desde o início?
-Sim, quero saber tudo. E te digo, estava bêbada, não respondia por mim.
Felipe sentou no sofá oposto ao que Camila estava sentada, mexendo em seu cabelo despenteado procurava palavras para explicar, enfim desabafou:
-Não sei se lembra, sou o guitarrista da banda, aquela banda que tocou no bar.  Desde que comecei a tocar prestei atenção em você, você estava alucinada. – Felipe fez uma pausa para respirar. – Você estava com suas amigas, bebendo tequila pelo que lembro.
Camila interrompeu:
-Hum, por isso o gosto ácido misturado com limão em minha boca, continue.
-A banda parou de tocar e fui beber como de costume, ao chegar à copa, lá estava você, doidona. Virou uma dose e disse Viva El México. Peguei uma cerveja e fiquei ali.  Você tentava conversar, se apresentou, falou muito. No momento que se deu conta suas amigas já não estavam mais, olhou para mim e disse: -Perdi minha carona, me leva pra casa. – Uma nova pausa para respirar, Camila estava perplexa e calada. – Fiz o favor de te trazer de carro para cá.
- Uma dúvida, como entrou no prédio e o carro a portaria? – Camila estava mais calma, e agora ainda mais confusa.
- Nem arrisquei entrar de carro, estacionei na rua lateral, e te trouxe a pé. O porteiro até me barrou, perguntou se você estava bem. Abriu depois que você gritou: - Liberado, está tudo liberado. E eu te trouxe aqui para cima, nos braços.
- E como acabamos dormindo juntos? – Camila foi direto ao seu ponto de interesse.
- Aconteceu, que quando entramos você me convidou para dormir aqui, que sentia sozinha. Pensando no que você seria capaz naquele estado, resolvi ficar. Minuto depois, você cismou em tomar banho. E começou me chamar aos berros, de dentro do banheiro. Fui antes que você arrumasse uma briga no prédio. Não queria me molhar, e você me molhou. Como não tinha outras roupas masculinas na casa e você já estava apagada seminua na cama, resolvi deitar de cueca mesmo. Dormi ali, ao teu lado, sem nem sentir dos teus lábios.
- Então não transamos? Você apenas me ajudou? – Camila parecia aliviada.
- Sim, por mais que adoraria dizer que foi uma bela transa, não rolou nada. E como sabe meu nome e nada mais?
- Olhei tua identidade.
- Não roubou nada? É nem tem o que roubar. E eu tomei a liberdade de por meu número em sua agenda do celular. Vou nessa, tenho que ver se ainda tenho carro. Cuida-se.
O estranho saiu pela porta, Camila nem se quer deu Adeus. Se aquilo que aconteceu, nunca saberá. Achou melhor acreditar que sim, ao menos não estava grávida.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Amor Virtual


Durante muito tempo a sala de Literatura Brasileira de um bate-papo qualquer, foi meu refúgio nos momentos de solidão. E ainda é. Sentada em meu quarto escuro acompanhada apenas por uma Xícara de café, eu conversava com dezenas de pessoas em uma única noite.
Aquilo era apenas um refúgio, refúgio do mundo real. A Internet para mim não era apenas números. Quantidade de contatos no MSN, visualizações de um blog, amigos no Orkut, vídeos, sites, infinitas palavras jogadas ao vento entre downloads e uploads. Eu era ingênua, sentada ali, prestava atenção em cada detalhe da conversa, em minha cabeça as palavras ganhavam vidas, os nomes tinham rostos, sentimentos afloravam dentro de mim.
Eu estudava de manhã, a tarde ficava por casa, olhava televisão ou repassava matéria.  Apenas depois que todos iam dormir que me dirigia para o meu refúgio. Nosso computador ficava na sala de estar em uma bancada ao lado da televisão. Então quando alguém estava assistindo televisão o computador deveria estar vago.
Em uma noite quente no início de março, bebia café frio, enquanto conversava com alguns colegas de escola pelo MSN, todos concordando comigo quanto à colocação das mesas no novo espelho de classe, achavam uma MERDA! E eu estava achando aquele papo um soco no estômago, me despedi educadamente dizendo a eles que iria dormir. Ao me despedir de todos, coloquei o MSN em offline, e encaminhei a atenção para o bate-papo que acabará de abrir.
A sala de literatura 1 estava lotada, me obriguei entrar na sala 2, minha entrada na sala foi repleta de Ois, acho que é assim com todas garotas que freqüentam. Não demorou muito para aparecer o primeiro engraçadinho afim de sexo.  Fui educada com o Tesudo cam, ele me perguntou:
-E ai gatinha, afim de sexo?                                                                                                        
- Não obrigado, tenta a sua mãe. – Quem  me conhece sabe que respeito até mesmo os tarados. 
Fiquei na sala por uns minutos, apenas respondendo as clássicas perguntas.
-Oi. Tudo bem?  Tecla de onde? – Acredite tem quem precise três mensagens para isso. O engraçado que o papo normalmente morre ali. Ou se atrevem a pedir a idade antes de se calar.
De repente uma mensagem de um estranho me chamou atenção.
-Curti Paulo Coelho?
- O Escritor? – Respondi sem me flagrar da tamanha besteira que escrevi.
- Não, o cara que compunha junto com Raul Seixas na década de oitenta.
- É o mesmo? Né?
-Essa é uma sala de literatura brasileira, Paulo Coelho é um dos maiores escritores da atualidade, se não o maior. Enfim, li O Alquimista. Agora estou entre, As Valkírias e Veronika decide morrer. Ambos dele.
-São duas boas histórias. Difícil definir a melhor.  – Nem acreditava no que estava dizendo, nunca ao menos havia folhado qualquer dos livros.
-Tá, quando eu ler, te conto qual é a melhor história! Acha que acredito que leu?  Tenta usar de mais convicção na próxima. “risos”.
Eu odiava não saber o que dizer, mas ele tinha me pego. Travada com as mãos postas sobre o teclado, tomei um gole de café e resolvi prosseguir o tom de piada que ele impôs.
- Você deve ser o próprio Paulo Coelho, quem usa “Risos” em um bate-papo?  Aqui se usa “rsrs”, “hsuahsuas” ou dezenas de definições para engraçado, mas “risos” você é o primeiro.
-Quem dera ser o próprio, sou apenas um apreciador de boas histórias. – Já você, parece procurar um escritor, por estar aqui. – Imaginei um cara de estilo intelectual, de voz grossa, mas muito educado.
- Na verdade, já ouvi muito sobre o Paulo Coelho. Sempre aqueles papos de Mago, ou da antiga sociedade alternativa que projetava erguer com o Raul Seixas. Acho que por isso que nunca li, não me interessei.
- Então me diga Bia. Esse Nick é algum derivado de Beatriz, Bianca talvez. Ou seria a sigla que criou para se denominar “Bonita, Inteligente e Amiga”?
- Bianca, meu nome.  Bonita, jamais.  Inteligente, faço o possível. Não diria amiga, diria amigável.
- Desculpe Bianca, mas, em todas minhas chances de aproximação você me repele. Não é lésbica? É?
- Uma dúvida, você procura uma dica de livro, ou uma namorada?  Se for livro, desculpe já descobriu que não leio Paulo Coelho. No caso da namorada, aqui para mim é curtição, distração. Procuro amigos, namoro não. – Naquele momento, temi ter sido amarga demais. Acabar espantando-o.
-OK. Meu nome é  Tomás. Tenho 20 anos, nasci e me criei na cidade de São Paulo, onde ainda moro. Não entro em bate-papo, entrei mesmo para ter a dica do livro. Na verdade, não entro mais. Durante um tempo entrei bastante, hoje me afastei, prefiro ler um bom livro. Sempre entro no MSN, você tem? Passa que te adiciono.
- É assim que funciona? Me diz seu nome, idade e onde mora,  e quer meu MSN? Preferia falar um pouco de mim, terei tempo se é que vai mesmo adicionar. ........................@hotmail.com . Estou offline amanhã te aceito.
-Não quero ser intrometido! Noto que somos as duas únicas pessoas que escrevem corretamente nessa sala. Tenho meus motivos, pode me dizer os seus?
- Não tenho grande motivo, escrevo certo por costume, não me deixo levar por essas abreviações de internet. Acredito que a internet não deve deixar as pessoas mais burras e sim o contrario. E quais são os seus motivos?
- Meu motivo é simples, curso letras na UFSP. Com isso devo escrever corretamente, seria estranho um professor que escreve errado. Não acha?
- Não sabia que era aluno da UFSP. Nem ao menos que fazia faculdade. Quem diria aluno de letras.  – O papo já estava rolando distraído, sem ênfases para o que deveria parecer engraçado.
-Está adicionada.
-Adicionada?
-MSN? Lembra?
-Desculpa-me, distraí. - Tudo que eu queria era um buraco para me esconder.
- Desculpe, já passou da uma. Tenho faculdade amanhã,  me aceita.
- Já aceitei.
-Aceitou? Não estava offline?
- Sim estou offline, ou melhor, status invisível... Você me vê como offline. – Estava realizada de ter conseguido aplicar uma nele.
-Tá  bom. Tchau, beijos. Diga-me, qual sua idade?
- 16, eu tenho 16.
- Amanhã teclamos.
-Beijos. Prazer em te conhecer. – Mas ele já havia saído da sala.
Desliguei o computador rapidamente, sem fechar nenhuma das paginas abertas. Após escovar os dentes, desliguei o estabilizador e fui deitar.
O dia seguinte foi um dia normal, estudei pela manhã, sai com as amigas a tarde e á noite voltei para meu refúgio. Abri diretamente o MSN, vi entre as fotos dos contados Online, um olho verde, um olho estranho para mim. Cliquei curiosa, ao abrir a janela, o email desconhecido se tornou um nome, Tomás.
Mandei um Olá minutos depois quando notei que não teria comprimento da parte dele.  Ele deu um simples oi.
Sem querer ser clichê, com aquelas perguntas clássicas, perguntei se decidira qual livro iria ler.
- Comprei os dois, na verdade comprei uma coleção de livros do Paulo Coelho, alguns que até eu já tinha, mas o preço estava em conta.
O papo estava ótimo .  Por todo o tempo imaginei como seria o dono do olho verde, resolvi pedir outra foto. Mas a minha estava ali durante todo o tempo e ele nem para me chamar de bela. Conformei-me ele era diferente dos outros, quando pedi a foto , não custou a me enviar.
-Não prefiro enviar, não gosto de mostrar fotos no MSN. Tem pessoas loucas, não sei o que podem fazer ao olhá-las.
- E eu, o que acha que posso fazer olhando?- Perguntei com um ar de piada, temendo a resposta.
- Te pergunto! O que acha que fiz olhando a sua por todo esse tempo?
Mas uma vez ele havia conseguido me fazer travar frente ao computador. Pelo visto gostava de encabular as garotas. O papo seguiu por horas, e eu cada vez com menos sono, e mais empolgada. Lembro que fui deitar as três da madrugada. Nem entrei no bate-papo aquela noite.
Durante os próximos dias colocamos limites no tempo de conversa, pelo menos durante a semana, mas não limitávamos os assuntos.
Só após uma semana ele me revelou ter acabado de sair de um relacionamento de dois anos, a garota que havia terminado. Não havia tempo para o casal. Ambos estudavam na mesma faculdade. Faziam cursos diferentes, mal se falavam.
No momento que me contou do término do relacionamento, notei estar abalada. Algo me deixou triste, não entendia o que. Ele tinha acabado o relacionamento, aceitando um pedido dela. Notei que foi uma frase que me abalou, ”Não havia tempo para o casal”.
Naquele dia notei estar apaixonada por um ser virtual, um cara que não passava de letras. E questionei os sentimentos dele, ele disse sentir o mesmo, mas não sabia se era carência pelo termino do namoro, ou estava realmente apaixonado. Trocamos números de telefone, várias fotos, e eu ligava para ele sempre que podia. Éramos um belo casal.
Algumas vezes ele também me telefonou, dizendo estar no intervalo da faculdade, sempre falava rápido e desligava. Sua voz era realmente como eu imaginará. E eu cada dia mais dependente daquilo tudo.
Em uma tarde de domingo, estava online, porém ele não. A tarde não passava, eu estava cabisbaixa, resolvi ligar para ele. Não era sempre que ele podia me atender, não custava tentar.
Chamou algumas vezes, o silêncio me mostrou que alguém atenderá.
-Alô, Tomás é você?- Falei antes mesmo de ter um sinal no outro lado da linha.
-Desculpe, o Tomás está no banho. Mas quer deixar recado?- Uma voz feminina perfeita respondeu.
-Você deve ser a Sarah? Irmã caçula dele. Prazer, eu ligo mais tarde. – Questionei, lembrando da garota que vi em algumas fotos do Orkut do Tomás, uma garota linda, um tanto parecida com ele.
 -Desculpe garota, você deve ter ligado para o número errado. Meu nome é Camila, sou a namorada dele. O Tomás no qual me refiro, é filho único, não tem irmã alguma. – Aquelas palavras doeram como uma navalha introduzida lentamente em meu peito. Ele havia mentido para mim, ele era uma mentira.
- Desculpe, me chamo Bianca. E acho que realmente liguei para o número errado.
Depois daquele telefonema, nunca mais falei com ele, sinto falta de sua voz.  A garota das fotos realmente se chama Camila, sua atual esposa. Meses depois o perfil do Tomás se tornou compartilhado pelo casal no Orkut, e lá vejo como ele está, vi que ele será pai estou feliz por ele.
Resolvi escrever minha história depois de ler um livro do Paulo Coelho,  As valkirias. Já no início do livro achei um poema, que me fez relembrar tudo. Este é o poema:
A gente sempre destrói aquilo que ama
em campo aberto, ou em uma emboscada;
alguns com a leveza de um carinho
outros com a dureza da palavra;
os covardes destroem com um beijo,
os valentes, destroem com a espada.

Oscar Wilde, Balada do cárcere de reading.  



sábado, 16 de outubro de 2010

Não me ama? Prove


Tudo que tinha era uma vela acesa diante dos seus olhos. Um dia foi linda, lindos cabelos negros, pele branca e lisa, seus lábios carnudos escondiam um sorriso invejável que era mantido em segredo por sua timidez.
Deitada no chão gelado do velho porão, Mariana observava sua pele, aqueles vários hematomas e as dezenas de mordidas. Acorrentada sem mal poder ver a luz do sol a semanas, servia de comida para ratos. Todas as noites quando o cansaço à fazia dormir, seus vizinhos vinham se alimentar de sua carne.
Só sabia que era manhã por que Jorge seu ex-namorado e seqüestrador vinha lhe trazer algum alimento, e entre desaforos lhe pedia uma reconciliação, isso quando não a surrava, com sua visita deixava entrar poucos raios de luz. Jorge apenas fazia visitas rápidas pela manhã, deixava o alimento, e trocava a vela, ai seguia para o trabalho. Todas as noites ele voltava. Em busca de sexo na maioria, e outras fazendo propostas de liberdade em troca de amor eterno.
Naquela manhã Jorge trousse dois pães e uma garrafa com água, após trocar a vela saiu. Mariana pegou a sacola e se arrastou até a parede, bebia pequenos goles da água enquanto mastigava o pão. Em sua cabeça estava à lembrança de quantas vezes reclamou da comida de sua mãe, e a certeza que nunca a comeria novamente.
Bebendo a água passou os olhos na corrente que a prendia pelo tornozelo esquerdo em uma das paredes do porão. A corrente grossa, pesada, estava totalmente enferrujada, junto ao tornozelo de Mariana trazia uma espécie de algema, que em um dos lados tinha uma simples dobradiça, e do outro um grosso parafuso preso por uma porca.  Voltou seu olhar para sua mão direita, seu dedão já sem unha, das tantas vezes que tentou afrouxar a tranca.
Contabilizou vinte e um dias desde que foi levada para o cativeiro. Eram três semanas de dias iguais, ela e aquele porão imundo, comia ao amanhecer e apanhava antes de dormir, só mudava o alimento e os pontos da dor. Nunca imaginará haver um porão de escravos naquela pequena cidade. Existia seu namorado conhecia, e agora a prenderá nele.
O porão pertence a uma casa centenária que está abandonada a mais de 50 anos, desconhecida por grande parte da população do município já foi ponto de comércio de escravos e depois de produtos produzidos pelos camponeses que na região residiam. Hoje é o cativeiro daquela bela jovem que espera pela morte.
Sentada com o seu corpo escorado na parede, Mariana observava a vela que queimava lentamente diante seus olhos. Os ratos corriam ao seu redor, quando um barulho a despertou de seus pensamentos, barulho este que vinha da porta do porão. Pensando estar salva Mariana pedia por socorro, mas um rosto conhecido surgiu diante de seus olhos, era Jorge. Como era sábado ele não precisará ir trabalhar, foi até o porão para ver Mariana.
- Mari meu amor, olha só o teu estado. Ai jogada, imunda em meio a esses ratos, essas feridas devem doer, doem? - Jorge estava eufórico, como uma criança que vê o carrinho do picolé.
-Cala sua boca, seu porco! Seu louco. – Gritou Mariana, se encolhendo mais e mais para junto da parede.
- Tudo seria tão simples, mas não. Você é teimosa.
- Jamais quis te enganar, te iludir em um falso amor. Por isso terminei. – Mariana estava com a voz triste, parecia que apesar de tudo sentirá pena de Jorge.
- Te falei no dia em que terminamos. Fique comigo, te ensinarei a me amar. Foi você que plantou o que colheu, era só aprender a me amar. – Lágrimas corriam dos olhos de Jorge.
- Poderia ter aprendido a te amar, mas com o tempo, em meio a uma amizade. Olha onde eu estou? Olha o que você se tornou, prefiro morrer que transar novamente com você. Estou morta por dentro. – Lágrimas agora também corriam dos olhos de Mariana, ela se calou.
Calado Jorge saiu, batendo a porta, e sem dar explicação. As lágrimas haviam encharcado seu rosto. O silêncio voltou a reinar no porão. Mariana mal percebeu a saída do ex. Com os punhos serrados ao rosto chorava, esperando mais uma surra. Notou sua volta, ele entrou rapidamente pela porta do porão a deixando aberta, trazia com sigo uma faca. Era uma faca de cozinha, grande com um cabo de chifre, aparentemente nova, sua lamina refletia o sol que entrava pela porta naquele inicio de tarde.
- Se realmente não me quer mais nos braços? Prove! Ta aqui a faca, terei o gosto em lhe te ver morrer, não me ama? Prove. – Jorge caminhou até a parede onde Mariana estava. Entregou-lhe a faca em mãos e ficou ali parado a poucos centímetros dela.
A jovem agora com a faca em punhos se colocou de joelhos, a girou lentamente entre os dedos e encostou a ponta da lâmina no próprio abdômen. Jorge estava de pé, sem mover um músculo.
Introduzindo a faca lentamente em seu corpo, Mariana exalava leves gemidos, terminou de enfiar a faca soltando um grito que ecoou pelo cômodo. Retirou a faca e a introduziu mais três vezes. Ao ver sua amada cair cuspindo sangue, Jorge a segura nos braços e a viu morrer.
Abalado e sem saber o que fazer, sem nem ao menos conseguir calcular as conseqüências dos fatos, retirou a faca do corpo de Mariana e se suicida, cortando os próprios pulsos.
“Os corpos do jovem casal, ou o que restam deles, ainda estão juntos no porão da velha casa.
“Já suas almas. Acredito que não.”

Lição de vida



 Último dia do fórum estudantil, eu era o terceiro palestrante, lembro como se fosse agora a diretora me anunciando:
- Está ai, um cara que tem para ensinar a vocês uma lição de vida... Com vocês Pedro da Silva.
Fui entrando devagar, um tanto quanto tímido, em meio inúmeras vaias, lembro de alguns garotos gritando:
- Olha lá, é o faxineiro...
Lá estava eu, na frente de 600 adolescentes, sem palavras, travado, até que uma garota logo a minha frente disse:
                 - Vai Pedro a noite é sua!
                 Aquilo para mim; Foi uma injeção de animo comecei minha palestra que era esta:
                 “Meu nome é Pedro da Silva, talvez seja apenas mais um Pedro, apenas um da Silva, mas minha vida foi muito doida, como vocês jovens costumam falar. Nasci uma pequena cidade no estado de Mato Grosso. Era de família humilde, estudei até a 2ª série do ensino fundamental, com 8 anos já ajudava meus pais na lavoura de fumo,pois não podia encarar a dura realidade de ver meus dois irmãozinhos  recém nascidos passando fome. Com treze anos, roubei pela primeira vez, foram objetos de um bazar, planejava os vender para arranjar grana para poder comprar remédios para minha mãe que estava doente, e comida para nossa casa... Fui pego, fui julgado pelos meus atos, me condenaram a permanecer em uma instituição de recuperação de menores infratores em Cuiabá, até o dia em que eu completasse 18 anos. Foi onde aprendi muitas coisas, “Arrombar carros , manusear facas e coisas do gênero”. Até hoje digo que aquilo não era recuperação para menores infratores, e sim, uma escola, que formava maiores infratores.Com muito sofrimento, cumpri minha pena sem nem ao menos tentar fugir ou receber uma visita de minha mãe. O único dia que sai da instituição antes do termino da pena, foi quando tinha acabado de completar 15 anos, sai para ir ao enterro de minha mãe, ela morreu vitima de um câncer de pulmão por causa do fumo das lavoras, nas quais trabalhávamos. Ao completar 18 anos fui liberado da pena, fui direto para minha terra, queria ver meu pai e meus irmão.
Chegando a minha casa, fui entrando, vi que não era mais minha família que morava ali que tinha uma família estranha, A mulher que ali morava, disse para que saísse antes que ela chamasse a policia, fiz o que ela mandou. Procurei noticias de meu pai, fiquei sabendo que ele tinha se suicidado, fez tal besteira dois meses após a morte de minha mãe. Meus irmãos foram encaminhados para adoção, eu estava só no mundo.
Ao perguntar sobre meus irmãos ouvi da senhora que morava na casa vizinha:
- Seus irmãos, foram adotados por um casal rico. Eles moram em São Paulo, vão crescer bem longe daqui, de toda essa pobreza, mas infelizmente longe de você...
Pensei em procurá-los, lembrei de tudo que havia ouvido sobre São Paulo, me fui. Peguei carona com um caminhão de cebola, fui sentado na carroceria. Ao chegar aqui fui imediatamente atrás de um emprego, pois sabia que seria dura a busca para eles. Quando cheguei a ma agencia de empregos, pedi se tinha vagas. Pediram-me se eu tinha carteira de trabalho, eu apenas disse que não tinha, e RG? O senhor perguntou com uma cara de desprezo. Respondi a ele, que eu já tive, mas ele havia sido perdido na viagem... Ele olhou em meus olhos e pediu escolaridade. Eu o falei que estudei ate a segunda série. Ele apenas sorriu e disse que não tinha vagas, após muito não, eu desisti.
Não tinha como eu voltar, não tinha nem idéia de onde estavam meus irmãos, eu precisava comer o jeito que achei foi pedir. É, após uma semana, eu era apenas mais um mendigo nas ruas de São Paulo, a cachaça que me tirava da solidão, era a mesma que me esquentava nas noites frias. As vezes ao pedir um simples trocado, eu ouvia senhores engravatado dizer em ar de deboche:
-Vai trabalhar!
                 Será que ele iria da um emprego a um jovem mendigo em uma calçada, acho que não; Muitas vezes acordava com a respiração ofegante, muito triste, havia sonhado com a minha família, mas logo ficava feliz, pois tinha vivido mais uma noite em meio as calçadas de São Paulo. Vi muitos mendigos morrer naquelas calçadas, alguns de frio outros de fome, muitos assassinados, sempre achei que meus dias estavam contados, foram sete longos anos elas ruas.
                 Um dia tudo mudou, amanheci em um quarto todo rosa, lindo, muito diferente dos albergues que costumava freqüentar ,quando menos esperei, entrou uma senhora, a dona Rose, tinha em suas mãos uma bandeja, o café da manhã. Eu apavorado, agradeci e disse que não podia aceitar, fui me retirando. Ela sorriu e não me deixou ir, disse:
                - Você está em minha casa, o senhor estava dormindo ai em frente, lavado em vomito, com ajuda de uns vizinhos te acolhi! Banhamos-te e o colocamos a dormir...
                 Voltei a agradecer, mas tinha que ir. Ela me mandou comer antes, enquanto comia, eu contei minha história a ela, ela emocionada, chorando, disse que também estava só. Pois sua filha tinha sido vitima de uma bala perdida a um anos, seu marido tinha tido um infarto fulminante a mais de dez anos. Eu não fui mais embora, eu tinha uma pessoa que se importava comigo. Com ajuda de Rose, abandonei as ruas, arranjei um emprego como servente de pedreiro, voltei a estudar, em três anos acabei o ensino fundamental, pois fiz supletivo.
 Comecei no ensino médio aqui na escola, após meio ano mudei de emprego, peguei aqui como faxineiro. Faz três anos que me formei, talvez alguns alunos lembrem de mim da época que estudei, tenho orgulho do meu emprego. Fim do ano passado fiz vestibular para jornalismo na UFSP, passei, estou completando o primeiro semestre. Espero poder um dia, escrever em jornais a verdadeira realidade. Hoje tenho trinta anos, só Deus sabe tudo que eu passei, mas realizei meu sonho, estou cursando a faculdade. E graças a ajuda de uma nobre senhora que me acolheu, estou casado com uma linda jovem que conheci no tempo que estudei aqui e estamos para ter nosso 2º filho.
Eu posso ser apenas um Pedro, um da Silva ou o Faxineiro, mas com ajuda de uma humilde senhora tracei meu destino, ele foi bom, e quero lutar para que o destino de muitos outros mendigos seja mudado...
Obrigado “
                  Após terminar a palestra não vi mais risos e sim lagrimas, todos me aplaudiram em pé... Após a palestra muitos alunos vieram me cumprimentar, mas uma jovem professora em especial, minutos após a palestra veio conversar comigo. Ela tinha lá seus 25 anos, ou melhor, 24. Tinha acabado de se formar em Letras, e estava começando seu trabalho na escola, como professora de português do Ensino Médio. Ela ficou muito comovida com minha história, mas ao desfecho notou que tinha grande chance dela ser a irmã, que eu vim procurar. Eu fiquei muito feliz, pois tinha chances de ter encontrado meus irmãos, ao perguntar de Joaquim, ela deu a péssima noticia, Joaquim, nosso irmão mais novo  havia morrido a dois anos, vitima de um atropelamento. Após muitas e muitas conversas, acreditávamos que éramos realmente irmãos, e mesmo que não fossemos nos considerávamos tais.
 Hoje tenho 45 anos, estou aqui com você minha filha, Carla sua tia, junto ao tumulo de seu tio Joaquim, lendo esse velho rascunho e vejo que realizei meus sonhos, garanti um futuro para vocês meus filhos e ainda sou dono do orfanato de nossa família, ainda sou o redator mais comentado do estado. E não posso esquecer, graças a esse exame que tenho nas mãos comprovo cientificamente que eu, Carla e o falecido Joaquim somos irmãos.  Mudei de vida e consegui cumprir meus objetivos.
OBS: Este é um trabalho de ficção, criado por mim ”Maiquel Renck” nada disso realmente aconteceu , existem muitos mendigos em nosso país, a realidade é dura, a maioria morre nas ruas e são enterrados como indigentes, a realidade podia ser diferente, mas atitude tomada pelo governo é muitas vezes de se revoltar... A vida continua e eu sou tratado como apenas mais um rebelde sem causa... Vamos fechar os olhos, pois “o que os olhos não vêem o coração não sente”, mas “A VERDADE ESTA LÁ”.