sábado, 16 de outubro de 2010

Lição de vida



 Último dia do fórum estudantil, eu era o terceiro palestrante, lembro como se fosse agora a diretora me anunciando:
- Está ai, um cara que tem para ensinar a vocês uma lição de vida... Com vocês Pedro da Silva.
Fui entrando devagar, um tanto quanto tímido, em meio inúmeras vaias, lembro de alguns garotos gritando:
- Olha lá, é o faxineiro...
Lá estava eu, na frente de 600 adolescentes, sem palavras, travado, até que uma garota logo a minha frente disse:
                 - Vai Pedro a noite é sua!
                 Aquilo para mim; Foi uma injeção de animo comecei minha palestra que era esta:
                 “Meu nome é Pedro da Silva, talvez seja apenas mais um Pedro, apenas um da Silva, mas minha vida foi muito doida, como vocês jovens costumam falar. Nasci uma pequena cidade no estado de Mato Grosso. Era de família humilde, estudei até a 2ª série do ensino fundamental, com 8 anos já ajudava meus pais na lavoura de fumo,pois não podia encarar a dura realidade de ver meus dois irmãozinhos  recém nascidos passando fome. Com treze anos, roubei pela primeira vez, foram objetos de um bazar, planejava os vender para arranjar grana para poder comprar remédios para minha mãe que estava doente, e comida para nossa casa... Fui pego, fui julgado pelos meus atos, me condenaram a permanecer em uma instituição de recuperação de menores infratores em Cuiabá, até o dia em que eu completasse 18 anos. Foi onde aprendi muitas coisas, “Arrombar carros , manusear facas e coisas do gênero”. Até hoje digo que aquilo não era recuperação para menores infratores, e sim, uma escola, que formava maiores infratores.Com muito sofrimento, cumpri minha pena sem nem ao menos tentar fugir ou receber uma visita de minha mãe. O único dia que sai da instituição antes do termino da pena, foi quando tinha acabado de completar 15 anos, sai para ir ao enterro de minha mãe, ela morreu vitima de um câncer de pulmão por causa do fumo das lavoras, nas quais trabalhávamos. Ao completar 18 anos fui liberado da pena, fui direto para minha terra, queria ver meu pai e meus irmão.
Chegando a minha casa, fui entrando, vi que não era mais minha família que morava ali que tinha uma família estranha, A mulher que ali morava, disse para que saísse antes que ela chamasse a policia, fiz o que ela mandou. Procurei noticias de meu pai, fiquei sabendo que ele tinha se suicidado, fez tal besteira dois meses após a morte de minha mãe. Meus irmãos foram encaminhados para adoção, eu estava só no mundo.
Ao perguntar sobre meus irmãos ouvi da senhora que morava na casa vizinha:
- Seus irmãos, foram adotados por um casal rico. Eles moram em São Paulo, vão crescer bem longe daqui, de toda essa pobreza, mas infelizmente longe de você...
Pensei em procurá-los, lembrei de tudo que havia ouvido sobre São Paulo, me fui. Peguei carona com um caminhão de cebola, fui sentado na carroceria. Ao chegar aqui fui imediatamente atrás de um emprego, pois sabia que seria dura a busca para eles. Quando cheguei a ma agencia de empregos, pedi se tinha vagas. Pediram-me se eu tinha carteira de trabalho, eu apenas disse que não tinha, e RG? O senhor perguntou com uma cara de desprezo. Respondi a ele, que eu já tive, mas ele havia sido perdido na viagem... Ele olhou em meus olhos e pediu escolaridade. Eu o falei que estudei ate a segunda série. Ele apenas sorriu e disse que não tinha vagas, após muito não, eu desisti.
Não tinha como eu voltar, não tinha nem idéia de onde estavam meus irmãos, eu precisava comer o jeito que achei foi pedir. É, após uma semana, eu era apenas mais um mendigo nas ruas de São Paulo, a cachaça que me tirava da solidão, era a mesma que me esquentava nas noites frias. As vezes ao pedir um simples trocado, eu ouvia senhores engravatado dizer em ar de deboche:
-Vai trabalhar!
                 Será que ele iria da um emprego a um jovem mendigo em uma calçada, acho que não; Muitas vezes acordava com a respiração ofegante, muito triste, havia sonhado com a minha família, mas logo ficava feliz, pois tinha vivido mais uma noite em meio as calçadas de São Paulo. Vi muitos mendigos morrer naquelas calçadas, alguns de frio outros de fome, muitos assassinados, sempre achei que meus dias estavam contados, foram sete longos anos elas ruas.
                 Um dia tudo mudou, amanheci em um quarto todo rosa, lindo, muito diferente dos albergues que costumava freqüentar ,quando menos esperei, entrou uma senhora, a dona Rose, tinha em suas mãos uma bandeja, o café da manhã. Eu apavorado, agradeci e disse que não podia aceitar, fui me retirando. Ela sorriu e não me deixou ir, disse:
                - Você está em minha casa, o senhor estava dormindo ai em frente, lavado em vomito, com ajuda de uns vizinhos te acolhi! Banhamos-te e o colocamos a dormir...
                 Voltei a agradecer, mas tinha que ir. Ela me mandou comer antes, enquanto comia, eu contei minha história a ela, ela emocionada, chorando, disse que também estava só. Pois sua filha tinha sido vitima de uma bala perdida a um anos, seu marido tinha tido um infarto fulminante a mais de dez anos. Eu não fui mais embora, eu tinha uma pessoa que se importava comigo. Com ajuda de Rose, abandonei as ruas, arranjei um emprego como servente de pedreiro, voltei a estudar, em três anos acabei o ensino fundamental, pois fiz supletivo.
 Comecei no ensino médio aqui na escola, após meio ano mudei de emprego, peguei aqui como faxineiro. Faz três anos que me formei, talvez alguns alunos lembrem de mim da época que estudei, tenho orgulho do meu emprego. Fim do ano passado fiz vestibular para jornalismo na UFSP, passei, estou completando o primeiro semestre. Espero poder um dia, escrever em jornais a verdadeira realidade. Hoje tenho trinta anos, só Deus sabe tudo que eu passei, mas realizei meu sonho, estou cursando a faculdade. E graças a ajuda de uma nobre senhora que me acolheu, estou casado com uma linda jovem que conheci no tempo que estudei aqui e estamos para ter nosso 2º filho.
Eu posso ser apenas um Pedro, um da Silva ou o Faxineiro, mas com ajuda de uma humilde senhora tracei meu destino, ele foi bom, e quero lutar para que o destino de muitos outros mendigos seja mudado...
Obrigado “
                  Após terminar a palestra não vi mais risos e sim lagrimas, todos me aplaudiram em pé... Após a palestra muitos alunos vieram me cumprimentar, mas uma jovem professora em especial, minutos após a palestra veio conversar comigo. Ela tinha lá seus 25 anos, ou melhor, 24. Tinha acabado de se formar em Letras, e estava começando seu trabalho na escola, como professora de português do Ensino Médio. Ela ficou muito comovida com minha história, mas ao desfecho notou que tinha grande chance dela ser a irmã, que eu vim procurar. Eu fiquei muito feliz, pois tinha chances de ter encontrado meus irmãos, ao perguntar de Joaquim, ela deu a péssima noticia, Joaquim, nosso irmão mais novo  havia morrido a dois anos, vitima de um atropelamento. Após muitas e muitas conversas, acreditávamos que éramos realmente irmãos, e mesmo que não fossemos nos considerávamos tais.
 Hoje tenho 45 anos, estou aqui com você minha filha, Carla sua tia, junto ao tumulo de seu tio Joaquim, lendo esse velho rascunho e vejo que realizei meus sonhos, garanti um futuro para vocês meus filhos e ainda sou dono do orfanato de nossa família, ainda sou o redator mais comentado do estado. E não posso esquecer, graças a esse exame que tenho nas mãos comprovo cientificamente que eu, Carla e o falecido Joaquim somos irmãos.  Mudei de vida e consegui cumprir meus objetivos.
OBS: Este é um trabalho de ficção, criado por mim ”Maiquel Renck” nada disso realmente aconteceu , existem muitos mendigos em nosso país, a realidade é dura, a maioria morre nas ruas e são enterrados como indigentes, a realidade podia ser diferente, mas atitude tomada pelo governo é muitas vezes de se revoltar... A vida continua e eu sou tratado como apenas mais um rebelde sem causa... Vamos fechar os olhos, pois “o que os olhos não vêem o coração não sente”, mas “A VERDADE ESTA LÁ”.

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